sexta-feira, 5 de novembro de 2010




ANJO DA GUARDA

Léon Denis



Todos temos um desses gênios tutelares que nos inspira nas horas difíceis e nos dirige pelo bom caminho.

Daí a poética tradição cristã do Anjo da Guarda.

Não há concepção mais grata e consoladora.

Saber que temos um amigo fiel e sempre disposto a nos socorrer, de perto como de longe, nos influenciando a grandes distâncias ou se conservando junto de nós nas provações; saber que ele nos aconselha por intuição e nos aquece com seu amor, eis uma fonte inapreciável de força moral.

O pensamento de que testemunhas benévolas e invisíveis vêem todos os nossos atos, regozijando-se ou entristecendo-se, deve inspirar-nos mais sabedoria e circunspeção.

É por essa proteção oculta que se fortificam os laços de solidariedade que ligam o mundo celeste à Terra, o Espírito livre ao homem, Espírito prisioneiro da carne.

É por essa assistência contínua que se criam, de um a outro lado, as simpatias profundas, as amizades duradouras e desinteressadas.

O amor que anima o espírito elevado vai pouco a pouco se estendendo a todos os seres sem cessar, revertendo tudo para Deus, pais das almas, foco de todas as potências efetivas.



Do livro "Depois da Morte..

domingo, 29 de agosto de 2010

A BUSCA

@ Terraespiritual



Em Dezembro de 1945, no Alto Egito , foram ewncontrados 52 textos escondidos em urnas debaixo do solo quente do deserto nas imediações da cidade de Nag Hammadi . Esta maravilhosa descoberta revelaria ao mundo um dos mais intrigantes evangelhos : o Evangelho de Tomé.

Logion 2

Jesus disse: O que busca não deve cessar de buscar até que encontre; quando encontrar ficará perturbado e uma vez perturbado se maravilhará e reinará sobre o todo.



COMENTÁRIOS

Aquele que busca



Este evangelho ( ou boa nova) , semelhante ao evangelho de João , parece ser endereçado a um público mais exigente e sequioso quanto ao conteúdo e profundidade dos assuntos a serem abordados . As novidades que este logion prenuncia , parecem ser a de há um caminho para a plenitude , para a transcendência e para encontrar a estrada que conduz ao Reino dos Céus.



Aqui também se percebe uma preocupação com aquele que parece ser o protagonista deste evangelho : o buscador.



O buscador é um inconformado com o estado aparente das coisas e parece perceber que há uma realidade divergente daquela que está diante de si e que tudo parece ser sombras refletidas na parede , ilusões na verdade .



Aos olhos do buscador , não parece haver encaixe perfeito entre a vida ordinária das pessoas ( e a sua própria) e a verdadeira Vida , multimanifestada em infinitas variedades de seres e situações.



Como se a Vida fosse um rio, e o buscador fosse um peixe fora d'água , este procura,sem saber como a princípio, o caminho de volta à harmonia e equilíbrio. Talvez a busca seja isso , mas talvez seja muito mais.



Na alma do buscador existe um anseio permanente em encontrar a Verdade , em desmascarar uma " matrix" ilusória , uma saudade do paraíso perdido.Talvez , por isso mantém-se em busca.



Não deve cessar de buscar



Como seus horizontes interiores são mais amplos do que a maioria de seus contemporâneos, os buscador , em geral , deseja explorar suas fronteiras, seus limites, ir além da linha do horizonte e quem sabe descobrir o que há por lá.



Vive motivado como se estivesse recebendo um chamado da Vida ,de momento a momento e talvez aquilo não deixe em paz o seu irriquieto coração. Talvez perceba que são muitos os chamados .E também talvez , seja este chamado oculto e insonoro, proveniente das entranhas de sua alma que o faça buscar pelo reino dos céus( o Caminho, a Verdade , a Vida , o Equilíbrio ou Plenitude, como o desejarem).



Como tem um mínimo de sensatez , sabe que ainda é uma criança espiritual e que a maturidade só será atingida ao custo da experiência de viver e de errar( o erro faz parte do processo de aprender).



Tem o mínimo de humildade de se levantar caso caia. Se cair sete vezes, levantará oito. É por isso que não desiste da jornada, e por isso prossegue. Na verdade , o ato de levantar demonstra o seu potencial de superação e até reforça sua fome e sua sede espiritual pelo Infinito.



Dessa forma, na prática ele segue o conselho do evangelista de "não cessar de buscar".Pode até não saber o que lhe aguarda, mas pressente que é muito bom. Começa a entrar em sintonia com a força da Vida.



Pensa o buscador que sua busca só se encerra quando encontrar o que busca,não antes. Talvez seja este tesouro a Verdade que liberta.



Quando encontrar ficará perturbado



Parece haver uma contradição , um paradoxo. Como poderia alguém encontrar algo maravilhoso e ainda assim se perturbar pela descoberta?Talvez fosse melhor não encontra-lo ou melhor ainda nem busca-lo.



Provavelmente a resposta esteja no fato de que o buscador tenha , por imaturidade natural, iniciado sua busca com uma maneira de ver o mundo em que vive, tem conceitos próprios sobre pessoas, situações, coisas , um sistema particular de ver a vida e de se relacionar com seus próprios processos mentais.



Porém , ao contato com as verdades que vai encontrando vão aparecendo conflitos , pois sua capacidade de compreensão é proporcional à sua maturidade vivencial.Talvez não tenha tanta bagagem psicológica quanto supunha , quando a viagem de busca começou.



Ao descobrir-se estar equivocado sobre assuntos que considerava dogmas intocáveis, ao desfazer-se perante seus próprios olhos que o que acreditava ser inquestionável realidade, é neste instante que ocorre uma ruptura entre o homem velho e o homem novo...



Não há parto natural sem dor.Mas após o parto , só alegrias do nascimento.Entre os dois momentos um hiato de sofrimento, de perturbação existencial.Talvez haja um renascer a caminho.



Seus antigos paradigmas não lhe satisfazem mais , seus deuses estão mortos , o vazio parece imperar,respira com sofreguidão, como se estivesse no limbo ou numa queda vertiginosa que não cessa . Sente-se extremamente só , mesmo em família ou na multidão.



É hora de recolher-se e observar a própria perturbação.É hora de juntar os cacos de sua alma e ver o que verdadeiramente sobrou de si mesmo .Talvez quarenta dias no deserto possam ser suficientes para proporcionar tempo para reconforto e deixar fechar as feridas abertas com suas próprias mãos.





E uma vez perturbado se maravilhará



Se após ocorrer a sedimentação de suas novas e surpreendentes descobertas sobre si e sobre a Vida ainda ; se após baixar a poeira do autoconhecimento ainda houver humildade de reconhecer que ainda há fome e sede pelo infinito , esta etapa estará superada . Uma nova etapa começa : a transformação.



Esta metanóya ou transformação é um novo renascer . É como se escamas fossem tiradas de nossos olhos com saliva e lodo e constatássemos que a nova realidade que se apresenta sempre esteve diante de nós . Era óbvio e ululante , porém parecia invisível aos nossos cegos e auto-iludidos olhos.É o fim do processo de desilusão e o começo do processo de libertação.A desilusão dói, porém liberta.



Libertação deixa maravilhada a alma escravizada por tanto tempo.Como é maravilhosa a sensação de liberdade.



Mas agora o buscador pressente que esta maravilhosa sensação de liberdade não é a liberdade definitiva e sim uma pequena liberdade das muitas que virão.E todas só serão conquistadas ao custo de dor de partejar a si mesmo .Muitas outras buscas virão.



Talvez , ao fim da última busca , encontrando a última pequena liberdade ele se torne maravilhado de descobrir que enfim é livre por que encontrou a Verdade (o Caminho, a Vida , o Equilíbrio e a Plenitude) .



E reinará sobre o todo.



A conseqüência natural de se maravilhar é desejar descobrir mais e mais . Para descobrir mais e mais terá que ter disciplina e discernimento para não ser precipitado . Não há pressa na busca.A eternidade se faz como um convidativo tapete vermelho esperando pelo buscador.



Estas maravilhas modificam o ambiente mental e com ele o agir torna-se mais natural e equilibrado . Como consequência das pequenas mudanças intrapessoais , começam a acontecer as pequenas mudanças de comportamento interpessoais. A paz ainda tem uma chance .



Como resultado sincero e verdadeiro , passa o buscador a nadar segundo a corrente , respeitando o fluxo da Vida e começando a ficar em equilíbrio com Ela. É neste momento, em que ele começa a manifestar sua força e seu poder,naturalmente surgidos desta busca e deste contato com cada pequena liberdade. Ele não é forte como aqueles que dominam e subjugam os outros , ele se torna poderoso porque controla a si mesmo( seus pensamentos, suas ações e seu corpo físico)





Correlatos canônicos

-"Pedi, e dar-se-vos-á; buscai, e achareis; batei e abrir-se-vos-á. Pois todo o que pede, recebe; e quem busca, acha; e ao que bate, abrir-se-lhe-á. "(Mat 7,7-8)

-"Pelo que eu vos digo: Pedi, e dar-se-vos-á; buscai e achareis; batei, e abrir-se-vos-á; pois todo o que pede, recebe; e quem busca acha; e ao que bate, abrir-se-lhe-á. "(Luc 11,9-10)

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

LIVRO DOS ESPIRITOS - ALLAN KARDEC




Capítulo I
Deus e o Infinito
1. O que é Deus?
—“ Deus é a inteligência suprema, causa primária de todas as coisas”.
2. O que devemos entender por infinito?
— “Aquilo que não tem começo nem fim; o desconhecido; todo o desconhecido é infinito”.
3. Poderiamos dizer que Deus é o infinito?
— “Definição incompleta. Pobreza da linguagem dos homens, insuficiente para definir as coisas que estão além da sua inteligência”.
Deus é infinito nas suas perfeições, mas o infinito é uma abstração; dizer que Deus é o infinito é tomar o atributo de uma coisa por ela mesma, definir uma coisa, ainda não conhecida, por outra que também não o é.
Provas da Existência de Deus
4. Onde podemos encontrar a prova da existência de Deus?
— “Num axioma que aplicais às vossas ciências: não há efeito sem causa. Procurai a causa de tudo o que não é obra do homem e vossa razão vos responderá”.
Para crer em Deus é suficiente lançar os olhos às obras da criação. O Universo existe; ele tem, portanto, uma causa. Duvidar da existência de Deus seria negar que todo efeito tem uma causa, e avançar que o nada pode fazer alguma coisa.
5. Que conseqüência podemos tirar do sentimento intuitivo, que todos os homens trazem consigo, da existência de Deus?
— “Que Deus existe; pois de onde lhes virá esse sentimento, se ele não se apoiasse em nada? É uma conseqüência do princípio de que não há efeito sem causa”.
6. O sentimento íntimo da existência de Deus, que trazemos conosco, não seria o efeito da educação e o produto de idéias adquiridas?
— “Se assim fosse, porque os vossos selvagens também teriam esse sentimento? “
Se o sentimento da existência de um ser supremo não fosse mais que o produto de um ensinamento, não seria universal e nem existiria, como as noções científicas senão entre os que tivessem podido receber esse ensinamento.
7. Poderíamos encontrar a causa primária da formação das coisas nas propriedades íntimas da matéria?
—“ Mas, então, qual seria a causa dessas propriedades? É sempre necessária uma causa primária”.
Atribuir a formação primária das coisas às propriedades íntimas da matéria seria tomar o efeito pela causa, pois essas propriedades são em si mesmas um efeito, que deve ter uma causa.
8. Que pensar da opinião que atribui a formação primária a uma combinação fortuita da matéria, ou seja, ao acaso?
— “Outro absurdo! Que homem de bom senso pode considerar o acaso como um ser inteligente? E, além disso, o que é o acaso? Nada!”
A harmonia que regula as forças do universo revela combinações e fins determinados, e por isso, mesmo um poder inteligente. Atribuir a formação primária ao acaso, seria uma falta de senso, porque o acaso é cego e não pode produzir efeitos inteligentes. Um acaso inteligente já não seria um acaso.
9. Onde se pode ver, na causa primária, uma inteligência suprema, superior a todas as outras?
— “Tendes um provérbio que diz o seguinte: pela obra se conhece o autor. Pois bem: vede a obra e procurai o autor! É o orgulho que gera a incredulidade. O homem orgulhoso nada admite fora de si, e é por isso que se considera um espírito forte. Pobre ser que um sopro de Deus pode abater!”
Julga-se o poder de uma inteligência pelas suas obras. Como nenhum ser humano pode criar o que a Natureza produz, a causa primária há de estar numa inteligência superior à Humanidade.
Sejam quais forem os prodígios realizados pela inteligência humana, esta inteligência tem também uma causa, e quanto maior for a sua realização, maior deve ser a causa primária. Esta inteligência superior é a causa primária de todas as coisas, qualquer que seja o nome pelo qual o homem a designe.
Atributos da Divindade
10. O homem pode compreender a natureza íntima de Deus?
— “Não. Falta-lhe, para tanto, um sentido”.
11. Será um dia permitido ao homem compreender o Mistério da Divindade?
— Quando o seu espírito não estiver mais obscurecido pela matéria e pela sua perfeição, tiver se aproximado dele, então o verá e compreenderá.
A inferioridade das faculdades do homem não lhe permite compreender a natureza íntima de Deus. Na infância da Humanidade o homem o confunde muitas vezes com a criatura, cujas imperfeições lhe atribui; mas, à medida que o seu senso moral se desenvolve, seu pensamento penetra melhor o fundo das coisas e ele faz, então, a seu respeito, uma idéia mais justa e mais conforme com a boa razão,embora sempre incompleta.
12. Se não podemos compreender a natureza íntima de Deus, podemos ter uma idéia de algumas de suas perfeições?
—“ Sim, de algumas. O homem se compreende melhor, à medida que se eleva sobre a matéria; ele as entrevê pelo pensamento”.
13. Quando dizemos que Deus é eterno, infinito, imutável, imaterial, único, todo-poderoso, soberanamente justo e bom, não temos uma idéia completa de seus atributos?
— “Do vosso ponto de vista, sim, porque acreditais abranger tudo; mas ficai sabendo que há coisas acima da inteligência do homem mais inteligente, e para as quais a vossa linguagem, limitada às vossas idéias e às vossas sensações, não dispõe de expressões. A razão vos diz que Deus deve ter essas perfeições em grau supremo, pois se tivesse uma de menos, ou que não fosse em grau infinito, não seria superior a tudo, e por conseguinte não seria Deus. Para estar acima de todas as coisas, Deus não deve estar sujeito a vicissitudes e não pode ter nenhuma das imperfeições que a imaginação é capaz de conceber”.
Deus é eterno. Se ele tivesse tido um começo, teria saído do nada, ou, então, teria sido criado por um ser anterior. É assim que, pouco a pouco, remontamos ao infinito e à eternidade.
É imutável. Se ele estivesse sujeito a mudanças, as leis que regem o Universo não teriam nenhuma estabilidade.
É imaterial. Quer dizer, sua natureza difere de tudo o que chamamos matéria, pois de outra forma ele não seria imutável, estando sujeito a transformações da matéria.
É o único. Se houvesse muitos Deuses, não haveria unidade de vistas nem de poder na organização do Universo.
É todo-poderoso. Porque é único. Se não tivesse o poder soberano, haveria alguma coisa mais poderosa ou tão poderosa quanto ele, que assim não teria feito todas as coisas. E aquelas que ele não tivesse feito seriam obras de um outro Deus.
É soberanamente justo e bom. A sabedoria providencial das leis divinas se revela nas menores como nas maiores coisas, e esta sabedoria não nos permite duvidar da sua justiça, nem da sua bondade.
Panteísmo
14. Deus é um ser distinto, ou seria, segundo a opinião de alguns a resultante de todas as forças e de todas as inteligências do Universo reunidas?
— “Se assim fosse, Deus não existiria, porque seria efeito e não a causa; ele não pode ser, ao mesmo tempo, uma coisa e outra”.
— “Deus existe, não o podeis duvidar, e isso é o essencial. Acreditai no que vos digo e não queirais ir além. Não vos percais num labirinto, de onde não podereis sair. Isso não vos tornaria melhores, mas talvez um pouco mais orgulhosos, porque acreditaríeis saber, quando na realidade nada saberíeis. Deixai, pois, de lado, todos esses sistemas; tendes que vos desembaraçar de muitas coisas que vos tocam mais diretamente. Isto vos será mais útil do que querer penetrar o que é impenetrável”.
15. Que pensar da opinião segundo a qual todos os corpos da Natureza, todos os seres, todos os globos do Universo seriam partes da Divindade e constituiriam, pelo seu conjunto, a própria Divindade; ou seja, que pensar da doutrina panteísta?
— “Não podendo ser Deus, o homem quer pelo menos ser uma parte de Deus”.
16. Os que professam essa doutrina pretendem nela encontrar a demonstração de alguns dos atributos de Deus. Sendo os mundos infinitos, Deus é, por isso mesmo, infinito; o vácuo ou o nada não existindo em parte alguma, Deus está em toda a parte; Deus estando em toda parte, pois que tudo é parte integrante de Deus, dá a todos os fenômenos da Natureza uma razão de ser inteligente. O que se pode opor a este raciocínio?
—“ A razão. Refleti maduramente e não vos será difícil reconhecer-lhe o absurdo”.
Esta doutrina faz de Deus um ser material que, embora dotado de inteligência suprema, seria em ponto grande aquilo que somos em ponto pequeno. Ora, a matéria se transformando sem cessar, Deus, nesse caso não teria nenhuma estabilidade e estaria sujeito a todas as vicissitudes e mesmo de todas as necessidades da Humanidade; faltar-lhe-ia um dos atributos essenciais da Divindade: a imutabilidade. As propriedades da matéria não podem ligar-se à idéia de Deus, sem que o rebaixemos em nosso pensamento, e todas as sutilezas do sofisma não conseguirão resolver o problema da sua natureza íntima. Não sabemos tudo o que ele é, mas sabemos aquilo que não pode ser, e este sistema está em contradição com as suas propriedades mais essenciais, pois confunde o criador com a criatura, precisamente como se quiséssemos que uma máquina engenhosa fosse parte integrante do mecânico que a concebeu.
A inteligência de Deus se revela nas suas obras, como a de um pintor no seu quadro; mas as obras de Deus não são o próprio Deus, como o quadro não é o pintor que o concebeu e executou.

domingo, 1 de agosto de 2010

Evangelho Segundo o Espiritismo - Capítulo XVII




Sede perfeitos


Caracteres da perfeição1. Amai os vossos inimigos; fazei o bem aos que vos odeiam e orai pelos que vos perseguem e caluniam. - Porque, se somente amardes os que vos amam que recompensa tereis disso? Não fazem assim também os publicanos? - Se unicamente saudardes os vossos irmãos, que fazeis com isso mais do que outros? Não fazem o mesmo os pagãos? -Sede, pois, vós outros, perfeitos, como perfeito é o vosso Pai celestial. (S. MATEUS, cap. V, vv. 44, 46 a 48.)

2. Pois que Deus possui a perfeição infinita em todas as coisas, esta proposição: "Sede perfeitos, como perfeito é o vosso Pai celestial", tomada ao pé da letra, pressuporia a possibilidade de atingir-se a perfeição absoluta. Se à criatura fosse dado ser tão perfeita quanto o Criador, tornar-se-ia ela igual a este, o que é inadmissível. Mas, os homens a quem Jesus falava não compreenderiam essa nuança, pelo que ele se limitou a lhes apresentar um modelo e a dizer-lhes que se esforçassem pelo alcançar.
Aquelas palavras, portanto, devem entender-se no sentido da perfeição relativa, a de que a Humanidade é suscetível e que mais a aproxima da Divindade. Em que consiste essa perfeição? Jesus o diz: "Em amarmos os nossos inimigos, em fazermos o bem aos que nos odeiam, em orarmos pelos que nos perseguem." Mostra ele desse modo que a essência da perfeição é a caridade na sua mais ampla acepção, porque implica a prática de todas as outras virtudes.
Com efeito, se se observam os resultados de todos os vícios e, mesmo, dos simples defeitos, reconhecer-se-á nenhum haver que não altere mais ou menos o sentimento da caridade, porque todos têm seu princípio no egoísmo e no orgulho, que lhes são a negação; e isso porque tudo o que sobreexcita o sentimento da personalidade destrói, ou, pelo menos, enfraquece os elementos da verdadeira caridade, que são: a benevolência, a indulgência, a abnegação e o devotamento. Não podendo o amor do próximo, levado até ao amor dos inimigos, aliar-se a nenhum defeito contrário à caridade, aquele amor é sempre, portanto, indício de maior ou menor superioridade moral, donde decorre que o grau da perfeição está na razão direta da sua extensão. Foi por isso que Jesus, depois de haver dado a seus discípulos as regras da caridade, no que tem de mais sublime, lhes disse: "Sede perfeitos, como perfeito é vosso Pai celestial."

O homem de bem3. O verdadeiro homem de bem é o que cumpre a lei de justiça, de amor e de caridade, na sua maior pureza. Se ele interroga a consciência sobre seus próprios atos, a si mesmo perguntará se violou essa lei, se não praticou o mal, se fez todo o bem que podia, se desprezou voluntariamente alguma ocasião de ser útil, se ninguém tem qualquer queixa dele; enfim, se fez a outrem tudo o que desejara lhe fizessem.
Deposita fé em Deus, na Sua bondade, na Sua justiça e na Sua sabedoria. Sabe que sem a Sua permissão nada acontece e se Lhe submete à vontade em todas as coisas.
Tem fé no futuro, razão por que coloca os bens espirituais acima dos bens temporais.
Sabe que todas as vicissitudes da vida, todas as dores, todas as decepções são provas ou expiações e as aceita sem murmurar.
Possuído do sentimento de caridade e de amor ao próximo, faz o bem pelo bem, sem esperar paga alguma; retribui o mal com o bem, toma a defesa do fraco contra o forte, e sacrifica sempre seus interesses à justiça.
Encontra satisfação nos benefícios que espalha, nos serviços que presta, no fazer ditosos os outros, nas lágrimas que enxuga, nas consolações que prodigaliza aos aflitos. Seu primeiro impulso é para pensar nos outros, antes de pensar em si, é para cuidar dos interesses dos outros antes do seu próprio interesse. O egoísta, ao contrário, calcula os proventos e as perdas decorrentes de toda ação generosa.
O homem de bem é bom, humano e benevolente para com todos, sem distinção de raças, nem de crenças, porque em todos os homens vê irmãos seus.
Respeita nos outros todas as convicções sinceras e não lança anátema aos que como ele não pensam.
Em todas as circunstâncias, toma por guia a caridade, tendo como certo que aquele que prejudica a outrem com palavras malévolas, que fere com o seu orgulho e o seu desprezo a suscetibilidade de alguém, que não recua à idéia de causar um sofrimento, uma contrariedade, ainda que ligeira, quando a pode evitar, falta ao dever de amar o próximo e não merece a demência do Senhor.
Não alimenta ódio, nem rancor, nem desejo de vingança; a exemplo de Jesus, perdoa e esquece as ofensas e só dos benefícios se lembra, por saber que perdoado lhe será conforme houver perdoado.
É indulgente para as fraquezas alheias, porque sabe que também necessita de indulgência e tem presente esta sentença do Cristo: "Atire-lhe a primeira pedra aquele que se achar sem pecado."
Nunca se compraz em rebuscar os defeitos alheios, nem, ainda, em evidenciá-los. Se a isso se vê obrigado, procura sempre o bem que possa atenuar o mal..
Estuda suas próprias imperfeições e trabalha incessantemente em combatê-las. Todos os esforços emprega para poder dizer, no dia seguinte, que alguma coisa traz em si de melhor do que na véspera.
Não procura dar valor ao seu espírito, nem aos seus talentos, a expensas de outrem; aproveita, ao revés, todas as ocasiões para fazer ressaltar o que seja proveitoso aos outros.
Não se envaidece da sua riqueza, nem de suas vantagens pessoais, por saber que tudo o que lhe foi dado pode ser-lhe tirado.
Usa, mas não abusa dos bens que lhe são concedidos, porque sabe que é um depósito de que terá de prestar contas e que o mais prejudicial emprego que lhe pode dar é o de aplicá-lo à satisfação de suas paixões.
Se a ordem social colocou sob o seu mando outros homens, trata-os com bondade e benevolência, porque são seus iguais perante Deus; usa da sua autoridade para lhes levantar o moral e não para os esmagar com o seu orgulho. Evita tudo quanto lhes possa tornar mais penosa a posição subalterna em que se encontram.
O subordinado, de sua parte, compreende os deveres da posição que ocupa e se empenha em cumpri-los conscienciosamente. (Cap. XVII, nº 9.)
Finalmente, o homem de bem respeita todos os direitos que aos seus semelhantes dão as leis da Natureza, como quer que sejam respeitados os seus.
Não ficam assim enumeradas todas as qualidades que distinguem o homem de bem; mas, aquele que se esforce por possuir as que acabamos de mencionar, no caminho se acha que a todas as demais conduz.

Os bons espíritas4. Bem compreendido, mas sobretudo bem sentido, o Espiritismo leva aos resultados acima expostos, que caracterizam o verdadeiro espírita, como o cristão verdadeiro, pois que um o mesmo é que outro. O Espiritismo não institui nenhuma nova moral; apenas facilita aos homens a inteligência e a prática da do Cristo, facultando fé inabalável e esclarecida aos que duvidam ou vacilam.
Muitos, entretanto, dos que acreditam nos fatos das manifestações não lhes apreendem as conseqüências, nem o alcance moral, ou, se os apreendem, não os aplicam a si mesmos. A que atribuir isso? A alguma falta de clareza da Doutrina? Não, pois que ela não contém alegorias nem figuras que possam dar lugar a falsas interpretações. A clareza e da sua essência mesma e é donde lhe vem toda a força, porque a faz ir direito à inteligência. Nada tem de misteriosa e seus iniciados não se acham de posse de qualquer segredo, oculto ao vulgo.
Será então necessária, para compreendê-la, uma inteligência fora do comum? Não, tanto que há homens de notória capacidade que não a compreendem, ao passo que inteligências vulgares, moços mesmo, apenas saídos da adolescência, lhes apreendem, com admirável precisão, os mais delicados matizes. Provém isso de que a parte por assim dizer material da ciência somente requer olhos que observem, enquanto a parte essencial exige um certo grau de sensibilidade, a que se pode chamar maturidade do senso moral, maturidade que independe da idade e do grau de instrução, porque é peculiar ao desenvolvimento, em sentido especial, do Espírito encamado.
Nalguns, ainda muito tenazes são os laços da matéria para permitirem que o Espírito se desprenda das coisas da Terra; a névoa que os envolve tira-lhes a visão do infinito, donde resulta não romperem facilmente com os seus pendores nem com seus hábitos, não percebendo haja qualquer coisa melhor do que aquilo de que são dotados. Têm a crença nos Espíritos como um simples fato, mas que nada ou bem pouco lhes modifica as tendências instintivas. Numa palavra: não divisam mais do que um raio de luz, insuficiente a guiá-los e a lhes facultar uma vigorosa aspiração, capaz de lhes sobrepujar as inclinações. Atêm-se mais aos fenômenos do que a moral, que se lhes afigura cediça e monótona. Pedem aos Espíritos que incessantemente os iniciem em novos mistérios, sem procurar saber se já se tornaram dignos de penetrar Os arcanos do Criador. Esses são os espíritas imperfeitos, alguns dos quais ficam a meio caminho ou se afastam de seus
irmãos em crença, porque recuam ante a obrigação de se reformarem, ou então guardam as suas simpatias para os que lhes compartilham das fraquezas ou das prevenções. Contudo, a aceitação do princípio da doutrina é um primeiro passo que lhes tornará mais fácil o segundo, noutra existência.
Aquele que pode ser, com razão, qualificado de espírita verdadeiro e sincero, se acha em grau superior de adiantamento moral. O Espírito, que nele domina de modo mais completo a matéria, dá-lhe uma percepção mais clara do futuro; os princípios da Doutrina lhe fazem vibrar fibras que nos outros se conservam inertes. Em suma: é tocado no coração, pelo que inabalável se lhe torna a fé. Um é qual músico que alguns acordes bastam para comover, ao passo que outro apenas ouve sons. Reconhece-se o verdadeiro espírita pela sua transformação moral e pelos esforços que emprega para domar suas inclinações más. Enquanto um se contenta com o seu horizonte limitado, outro, que apreende alguma coisa de melhor, se esforça por desligar-se dele e sempre o consegue, se tem firme a vontade.

Parábola do semeador5. Naquele mesmo dia, tendo saído de casa, Jesus sentou-se à borda do mar; - em torno dele logo reuniu-se grande multidão de gente; pelo que entrou numa barca, onde sentou-se, permanecendo na margem todo o povo. - Disse então muitas coisas por parábolas, falando-lhes assim:
Aquele que semeia saiu a semear; - e, semeando, uma parte da semente caiu ao longo do caminho e os pássaros do céu vieram e a comeram. - Outra parte caiu em lugares pedregosos onde não havia muita terra; as sementes logo brotaram, porque carecia de profundidade a terra onde haviam caído. - Mas, levantando-se, o sol as queimou e, como não tinham raízes, secaram. - Outra parte caiu entre espinheiros e estes, crescendo, as abafaram. Outra, finalmente, caiu em terra boa e produziu frutos, dando algumas sementes cem por um, outras sessenta e outras trinta. - Ouça quem tem ouvidos de ouvir. (S. MATEUS, cap. XIII, vv. 1 a 9.)
Escutai, pois, vós outros a parábola do semeador. - Quem quer que escuta a palavra do reino e não lhe dá atenção, vem o espírito maligno e tira o que lhe fora semeado no coração. Esse é o que recebeu a semente ao longo do caminho. - Aquele que recebe a semente em meio das pedras é o que escuta a palavra e que a recebe com alegria no primeiro momento. - Mas, não tendo nele raízes, dura apenas algum tempo. Em sobrevindo reveses e perseguições por causa da palavra, tira ele daí motivo de escândalo e de queda. -
Aquele que recebe a semente entre espinheiros é o que ouve a palavra; mas, em quem, logo, os cuidados deste século e a ilusão das riquezas abafam aquela palavra e a tornam infrutífera. - Aquele, porém, que recebe a semente em boa terra é o que escuta a palavra, que lhe presta atenção e em quem ela produz frutos, dando cem ou sessenta, ou trinta por um. (S. MATEUS, cap. XIII. vv. 18 a 23.)

6. A parábola do semeador exprime perfeitamente os matizes existentes na maneira de serem utilizados os ensinos do Evangelho. Quantas pessoas há, com efeito, para as quais não passa ele de letra morta e que, como a semente caída sobre pedregulhos, nenhum fruto dá!
Não menos justa aplicação encontra ela nas diferentes categorias espíritas. Não se acham simbolizados nela os que apenas atentam nos fenômenos materiais e nenhuma conseqüência tiram deles, porque neles mais não vêem do que fatos curiosos? Os que apenas se preocupam com o lado brilhante das comunicações dos Espíritos, pelas quais só se interessam quando lhes satisfazem à imaginação, e que, depois de as terem ouvido, se conservam tão frios e indiferentes quanto eram? Os que reconhecem muito bons os conselhos e os admiram, mas para serem aplicados aos outros e não a si próprios? Aqueles, finalmente, para os quais essas instruções são como a semente que cai em terra boa e dá frutos?

INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS
O dever7. O dever é a obrigação moral da criatura para consigo mesma, primeiro, e, em seguida, para com os outros. O dever é a lei da vida. Com ele deparamos nas mais ínfimas particularidades, como nos atos mais elevados. Quero aqui falar apenas do dever moral e não do dever que as profissões impõem.
Na ordem dos sentimentos, o dever é muito difícil de cumprir-se, por se achar em antagonismo com as atrações do interesse e do coração. Não têm testemunhas as suas vitórias e não estão sujeitas à repressão suas derrotas. O dever íntimo do homem fica entregue ao seu livre-arbítrio. O aguilhão da consciência, guardião da probidade interior, o adverte e sustenta; mas, muitas vezes, mostra-se impotente diante dos sofismas da paixão. Fielmente observado, o dever do coração eleva o homem; como determiná-lo, porém, com exatidão? Onde começa ele? onde termina? O dever principia, para cada um de vós, exatamente no ponto em que ameaçais a felicidade ou a tranqüilidade do vosso próximo; acaba no limite que não desejais ninguém transponha com relação a vós.
Deus criou todos os homens iguais para a dor. Pequenos ou grandes, ignorantes ou instruídos, sofrem todos pelas mesmas causas, a fim de que cada um julgue em sã consciência o mal que pode fazer. Com relação ao bem, infinitamente vário nas suas expressões, não é o mesmo o critério. A igualdade em face da dor é uma sublime providência de Deus, que quer que todos os seus filhos, instruídos pela experiência comum, não pratiquem o mal, alegando ignorância de seus efeitos.
O dever é o resumo prático de todas as especulações morais; é uma bravura da alma que enfrenta as angústias da luta; é austero e brando; pronto a dobrar-se às mais diversas complicações, conserva-se inflexível diante das suas tentações. O homem que cumpre o seudever ama a Deus mais do que as criaturas e ama as criaturas mais do que a si mesmo. E a um tempo juiz e escravo em causa própria.
O dever é o mais belo laurel da razão; descende desta como de sua mãe o filho. O homem tem de amar o dever, não porque preserve de males a vida, males aos quais a Humanidade não pode subtrair-se, mas porque confere à alma o vigor necessário ao seu desenvolvimento.
O dever cresce e irradia sob mais elevada forma, em cada um dos estágios superiores da Humanidade. Jamais cessa a obrigação moral da criatura para com Deus. Tem esta de refletir as virtudes do Eterno, que não aceita esboços imperfeitos, porque quer que a beleza da sua obra resplandeça a seus próprios olhos. - Lázaro. (Paris, 1863.)

A virtude8. A virtude, no mais alto grau, é o conjunto de todas as qualidades essenciais que constituem o homem de bem. Ser bom, caritativo, laborioso, sóbrio, modesto, são qualidades do homem virtuoso. Infelizmente, quase sempre as acompanham pequenas enfermidades morais que as desornam e atenuam. Não é virtuoso aquele que faz ostentação da sua virtude, pois que lhe falta a qualidade principal: a modéstia, e tem o vício que mais se lhe opõe: o orgulho. A virtude, verdadeiramente digna desse nome, não gosta de estadear-se. Adivinham-na; ela, porém, se oculta na obscuridade e foge à admiração das massas. S. Vicente de Paulo era virtuoso; eram virtuosos o digno cura d'Ars e muitos outros quase desconhecidos do mundo, mas conhecidos de Deus. Todos esses homens de bem ignoravam que fossem virtuosos; deixavam-se ir ao sabor de suas santas inspirações e praticavam o bem com desinteresse completo e inteiro esquecimento de si mesmos.
À virtude assim compreendida e praticada é que vos convido, meus filhos; a essa virtude verdadeiramente cristã e verdadeiramente espírita é que vos concito a consagrar-vos. Afastai, porém, de vossos corações tudo o que seja orgulho, vaidade, amor-próprio, que sempre desadornam as mais belas qualidades. Não imiteis o homem que se apresenta como modelo e trombeteia, ele próprio, suas qualidades a todos os ouvidos complacentes. A virtude que assim se ostenta esconde muitas vezes uma imensidade de pequenas torpezas e de odiosas covardias.
Em princípio, o homem que se exalça, que ergue uma estátua à sua própria virtude, anula, por esse simples fato, todo mérito real que possa ter. Entretanto, que direi daquele cujo único valor consiste em parecer o que não é? Admito de boamente que o homem que pratica o bem experimenta uma satisfação íntima em seu coração; mas, desde que tal satisfação se exteriorize, para colher elogios, degenera em amor-próprio.
O vós todos a quem a fé espírita aqueceu com seus raios, e que sabeis quão longe da perfeição está o homem, jamais esbarreis em semelhante escolho. A virtude é uma graça que desejo a todos os espíritas sinceros. Contudo, dir-lhes-ei: Mais vale pouca virtude com modéstia, do que muita com orgulho. Pelo orgulho é que as humanidades sucessivamente se hão perdido; pela humildade é que um dia elas se hão de redimir. François-Nicolas-Madeleine. (Paris, 1863.)

Os superiores e os inferiores9. A autoridade, tanto quanto a riqueza, é uma delegação de que terá de prestar contas aquele que se ache dela investido. Não julgueis que lhe seja ela conferida para lhe proporcionar o vão prazer de mandar; nem, conforme o supõe a maioria dos potentados da Terra, como um direito, uma propriedade. Deus, aliás, lhes prova constantemente que não é nem uma nem outra coisa, pois que deles a retira quando lhe apraz. Se fosse um privilégio inerente às suas personalidades, seria inalienável. A ninguém cabe dizer que uma coisa lhe pertence, quando lhe pode ser tirada sem seu consentimento. Deus confere a autoridade a título de missão, ou de prova, quando o entende, e a retira quando julga conveniente.
Quem quer que seja depositário de autoridade, seja qual for a sua extensão, desde a do senhor sobre o seu servo, até a do soberano sobre o seu povo, não deve olvidar que tem almas a seu cargo; que responderá pela boa ou má diretriz que dê aos seus subordinados e que sobre ele recairão as faltas que estes cometam, os vícios a que sejam arrastados em conseqüência dessa diretriz ou dos maus exemplos, do mesmo modo que colherá os frutos da solicitude que empregar para os conduzir ao bem. Todo homem tem na Terra uma missão, grande ou pequena; qualquer que ela seja, sempre lhe é dada para o bem; falseá-la em seu princípio é, pois, falir ao seu desempenho.
Assim como pergunta ao rico: "Que fizeste da riqueza que nas tuas mãos devera ser um manancial a espalhar a fecundidade ao teu derredor", também Deus inquirirá daquele que disponha de alguma autoridade: "Que uso fizeste dessa autoridade? Que males evitaste? Que progresso facultaste? Se te dei subordinados, não foi para que os fizesses escravos da tua vontade, nem instrumentos dóceis aos teus caprichos ou à tua cupidez; fiz-te forte e confiei-te os que eram fracos, para que os amparasses e ajudasses a subir ao meu seio."
O superior, que se ache compenetrado das palavras do Cristo, a nenhum despreza dos que lhe estejam submetidos, porque sabe que as distinções sociais não prevalecem às vistas de Deus. Ensina-lhe o Espiritismo que, se eles hoje lhe obedecem, talvez já lhe tenham dado ordens, ou poderão dar-lhas mais tarde, e que ele então será tratado conforme os haja tratado, quando sobre eles exercia autoridade.
Mas, se o superior tem deveres a cumprir, o inferior, de seu lado, também os tem e não menos sagrados. Se for espírita, sua consciência ainda mais imperiosamente lhe dirá que não pode considerar-se dispensado de cumpri-los, nem mesmo quando o seu chefe deixe de dar cumprimento aos que lhe correm, porquanto sabe muito bem não ser lícito retribuir o mal com o mal e que as faltas de uns não justificam as de outrem. Se a sua posição lhe acarreta sofrimentos, reconhecerá que sem dúvida os mereceu, porque, provavelmente, abusou outrora da autoridade que tinha, cabendo-lhe, portanto, experimentar a seu turno o que fizera sofressem os outros. Se se vê forçado a suportar essa posição, por não encontrar outra melhor, o Espiritismo lhe ensina a resignar-se, como constituindo isso uma prova para a sua humildade, necessária ao seu adiantamento. Sua crença lhe orienta a conduta e o induz a proceder como quereria que seus subordinados procedessem
para com ele, caso fosse o chefe. Por isso mesmo, mais escrupuloso se mostra no cumprimento de suas obrigações, pois compreende que toda negligência no trabalho que lhe está determinado redunda em prejuízo para aquele que o remunera e a quem deve ele o seu tempo e os seus esforços. Numa palavra: solicita-o o sentimento do dever, oriundo da sua fé, e a certeza de que todo afastamento do caminho reto implica uma dívida que, cedo ou tarde, terá de pagar. - François-Nicolas-Madeleine, Cardeal Morlot. (Paris, 1863.)

O homem no mundo10. Um sentimento de piedade deve sempre animar o coração dos que se reúnem sob as vistas do Senhor e imploram a assistência dos bons Espíritos. Purificai, pois, os vossos corações; não consintais que neles demore qualquer pensamento mundano ou fútil. Elevai o vosso espírito àqueles por quem chamais, a fim de que, encontrando em vós as necessárias disposições, possam lançar em profusão a semente que é preciso germine em vossas almas e dê frutos de caridade e justiça.
Não julgueis, todavia, que, exortando-vos incessantemente à prece e à evocação mental, pretendamos vivais uma vida mística, que vos conserve fora das leis da sociedade onde estais condenados a viver. Não; vivei com os homens da vossa época, como devem viver os homens. Sacrificai às necessidades, mesmo às frivolidades do dia, mas sacrificai com um sentimento de pureza que as possa santificar.
Sois chamados a estar em contacto com espíritos de naturezas diferentes, de caracteres opostos: não choqueis a nenhum daqueles com quem estiverdes. Sede joviais, sede ditosos, mas seja a vossa jovialidade a que provém de uma consciência limpa, seja a vossa ventura a do herdeiro do Céu que conta os dias que faltam para entrar na posse da sua herança.
Não consiste a virtude em assumirdes severo e lúgubre aspecto, em repelirdes os prazeres que as vossas condições humanas vos permitem. Basta reporteis todos os atos da vossa vida ao Criador que vo-la deu; basta que, quando começardes ou acabardes uma obra, eleveis o pensamento a esse Criador e lhe peçais, num arroubo d'alma, ou a sua proteção para que obtenhais êxito, ou a sua bênção para ela, se a concluístes. Em tudo o que fizerdes, remontai à Fonte de todas as coisas, para que nenhuma de vossas ações deixe de ser purificada e santificada pela lembrança de Deus.
A perfeição está toda, como disse o Cristo, na prática da caridade absoluta; mas, os deveres da caridade alcançam todas as posições sociais, desde o menor até o maior. Nenhuma caridade teria a praticar o homem que vivesse insulado. Unicamente no contacto com os seus semelhantes, nas lutas mais árduas é que ele encontra ensejo de praticá-la. Aquele, pois, que se isola priva-se voluntariamente do mais poderoso meio de aperfeiçoar-se; não tendo de pensar senão em si, sua vida é a de um egoísta. (Capítulo V, nº 26.)
Não imagineis, portanto, que, para viverdes em comunicação constante conosco, para viverdes sob as vistas do Senhor, seja preciso vos cilicieis e cubrais de cinzas. Não, não, ainda uma vez vos dizemos. Ditosos sede, segundo as necessidades da Humanidade; mas, que jamais na vossa felicidade entre um pensamento ou um ato que o possa ofender, ou fazer se vele o semblante dos que vos amam e dirigem. Deus é amor, e aqueles que amam santamente ele os abençoa. Um Espírito Protetor. (Bordéus, 1863.)

Cuidar do corpo e do espírito11. Consistirá na maceração do corpo a perfeição moral? Para resolver essa questão, apoiar-me-ei em princípios elementares e começarei por demonstrar a necessidade de cuidar-se do corpo que, segundo as alternativas de saúde e de enfermidade, influi de maneira muito importante sobre a alma, que cumpre se considere cativa da carne. Para que essa prisioneira viva, se expanda e chegue mesmo a conceber as ilusões da liberdade, tem o corpo de estar são, disposto, forte. Façamos uma comparação: Eis se acham ambos em perfeito estado; que devem fazer para manter o equilíbrio entre as suas aptidões e as suas necessidades tão diferentes? Inevitável parece a luta entre os dois e difícil achar-se o segredo de como chegarem a equilíbrio. (1)
(1) O último período desse parágrafo - "inevitável parece a luta entre os dois e difícil achar-se o segredo de como chegarem a equilíbrio" não aparece nas novas edições francesas desde a 3ª, mas se acha na 1ª edição e, por isso, a repomos no texto, corrigindo um evidente erro de impressão. - A Editora.
Dois sistemas se defrontam: o dos ascetas, que tem por base o aniquilamento do corpo, e o dos materialistas, que se baseia no rebaixamento da alma. Duas violências quase tão insensatas uma quanto a outra. Ao lado desses dois grandes partidos, formiga a numerosa tribo dos indiferentes que, sem convicção e sem paixão, são mornos no amar e econômicos no gozar. Onde, então, a sabedoria? Onde, então, a ciência de viver? Em parte alguma; e o grande problema ficaria sem solução, se o Espiritismo não viesse em auxílio dos pesquisadores, demonstrando-lhes as relações que existem entre o corpo e a alma e dizendo-lhes que, por se acharem em dependência mútua, importa cuidar de ambos. Amai, pois, a vossa alma, porém, cuidai igualmente do vosso corpo, instrumento daquela. Desatender as necessidades que a própria Natureza indica, é desatender a lei de Deus. Não castigueis o corpo pelas faltas que o vosso livre-arbítrio o induziu a cometer e
pelas quais é ele tão responsável quanto o cavalo mal dirigido, pelos acidentes que causa. Sereis, porventura, mais perfeitos se, martirizando o corpo, não vos tornardes menos egoístas, nem menos orgulhosos e mais caritativos para com o vosso próximo? Não, a perfeição não está nisso: está toda nas reformas por que fizerdes passar o vosso Espírito. Dobrai-o, submetei-o, humilhai-o, mortificai-o: esse o meio de o tornardes dócil à vontade de Deus e o único de alcançardes a perfeição. Jorge, Espírito Protetor. (Paris, 1863.).

(O Evangelho Segundo o Espiritismo - Capítulo XVII)

sexta-feira, 30 de julho de 2010



UMA PRECE À DEUS
Extraído do traité sur la Tolérance de
Voltáire, tradução JC Mino - M.M

Não é mais aos homens que me dirijo Senhor é a Ti, Deus de todos os seres, de todos os mundos, de todos os tempos.
Se for permitido a falíveis criaturas perdidas na imensidão e imperceptíveis ao resto do universo ousar-te pedir qualquer coisa, é a ti, que tudo tens feito, é a ti cujas vontades são imutáveis e eternas, digna-te ver com piedade os erros comuns à nossa natureza, para que esses erros não agravem as nossas desgraças.
Tu que não nos deste coração para odiar e nem mãos para sufocar, faz com que nós nos ajudemos mutuamente a suportar o fardo de uma vida penosa e passageira; que as pequenas diferenças entre as roupas que revestem nossos corpos débeis, entre nossas línguas incompetentes, entre todos os nossos costumes ridículos, entre todas as nossas leis imperfeitas, entre todas as nossas opiniões insensatas, entre todas as nossas condições, tão diferentes aos nossos olhos, e tão iguais perante a Ti, que estas pequenas nuanças que diferenciam os átomos chamados homens não sejam motivo de ódio e perseguição.
Que aqueles que acendam círios em pleno dia para Te celebrar ajudem àqueles que se contentam com a luz do teu sol.
Que os que cobrem as roupas com um manto branco para afirmar que é preciso Te amar não mais detestem os que dizem a mesma coisa sob um manto de lã negra.
Que seja o mesmo Te adorar em um dialeto originário de uma língua antiga ou em um falar mais moderno.
Que aqueles que dominam sobre um pequeno pedaço de um pequeno monte de lama do mundo e que possuem alguns fragmentos redondos de um certo metal desfrutem sem orgulho do que chamam poder e riqueza, e que os outros o vejam sem inveja; porque tu sabes que não há nestas vaidades, nem do que invejar nem do que se orgulhar.
Possam todos os homens se lembrar de que são irmãos.
Que tenham horror da tirania exercida sobre as almas, como execrem a violência, que obtém pela força o fruto do trabalho.
Se os flagelos da guerra são inevitáveis, não nos odiemos, não nos dilaceremos uns aos outros em nome da paz, e empreguemos o instante que é nossa existência a agradecer em mil linguagens desde o Sião até a California, tua bondade que nos permitiu este instante.

Do Livro A NOVA CIÊNCIA E A FÉ de Moacir Costa de Araújo Lima

quinta-feira, 22 de julho de 2010

A VIDA




Tanta vida em uma piscada tão rápida que parece não restar tempo para a vida. Quantas perguntas! Tantas respostas! Como podemos armazená-las neste abrir e fechar de olhos ou neste tempo que não passa....
Caminhamos atrás da razão e a razão caminha no nosso passo, nem no antes nem no depois, tão somente no agora.Tanto que a queremos possuí-la, e sempre é ela a nos possuir, e quando assim o permitimos o nosso Espírito comunga com Deus...E aí o que importa o tempo??? Encontramos a VIDA!!!!!

sábado, 5 de junho de 2010

O Espiritismo em seu tríplice aspecto: científico, filosófico e religioso




O Espiritismo em seu tríplice aspecto: científico, filosófico e religioso
Silvio Seno Chibeni

Texto elaborado para o XII Congresso Estadual de Espiritismo (USE) – Tema 4.10. Campinas, 17 a 20/4/2003.

Resumo:
Tornou-se comum no meio espírita afirmar-se que o Espiritismo é ciência, filosofia e religião, ou tem um “tríplice aspecto”, englobando as três áreas. Essa caracterização não pode ser encontrada exatamente nesses termos na obra de Kardec. É, porém, correta e, em sua essência, está presente no pensamento do criador do Espiritismo e de seus mais lúcidos continuadores. No entanto, a questão tem dado lugar a mal-entendidos, por causa da compreensão incorreta ou imprecisa dos conceitos de ciência, filosofia e religião, bem como da verdadeira natureza do Espiritismo. Este trabalho procura contribuir para esclarecer o assunto, com o apoio da filosofia e dos próprios textos de Kardec.

1. Introdução
Ao refundir o material da primeira edição de O Livro dos Espíritos (1857), preparando a segunda edição (1860), Kardec achou por bem inserir, já na primeira linha da livro, na folha de rosto, a seguinte frase: “Filosofia Espiritualista”. Kardec quis, com ela, fornecer ao leitor uma caracterização sucinta do caráter do Espiritismo, cujas bases a obra assentava. Essa caracterização é depois detalhada de modo implícito ou explícito no resto do livro e no restante de sua produção espírita. Uma das primeiras especializações do conceito expresso na frase é introduzida já na Introdução do mesmo livro, item I, no qual Kardec traça a distinção entre espiritualismo e Espiritismo. A partir desse ponto, tratará sempre (salvo para efeito de comparação) do conceito mais específico de filosofia espírita.

O destaque dado por Kardec a esse conceito indica que é por ele que devemos começar a análise do chamado “tríplice aspecto” do Espiritismo. Essa caracterização não pode ser encontrada exatamente nesses termos na obra de Kardec. Não nos ocuparemos aqui da questão histórica da origem dessa maneira tão disseminada de compreender o Espiritismo. Nosso objetivo neste artigo é estabelecer que ela é, em sua essência, correta, e que está presente no pensamento do criador do Espiritismo. Além disso, pretendemos esclarecer alguns mal-entendidos a que a caracterização tem dado lugar, por causa da compreensão incorreta, ou imprecisa dos conceitos de ciência, filosofia e religião, bem como da verdadeira natureza do Espiritismo.

2. O que é filosofia?
Antes de tentarmos entender o que Kardec entendia por ‘filosofia espírita’, e por que ele priorizou essa noção ao dar uma fórmula sucinta do Espiritismo, é importante compreendermos a noção geral de filosofia. É claro que se trata de um assunto complexo, que requereria estudos especializados para ser abordado de forma satisfatória. O que exporemos aqui é apenas um esboço, mas que, tanto quanto julgamos, é correto e útil para investigações ulteriores.

Como quase todas as palavras, filosofia possui diversos significados. Popularmente, o termo tem hoje três acepções principais: 1) certos valores ou princípios de vida, muito gerais e variáveis segundo os indivíduos ou grupos sociais; 2) certos métodos, regras e propósitos de um empreendimento qualquer; e 3) certas doutrinas esotéricas ou místicas. Nenhum desses três significados corresponde à noção original, acadêmica, de filosofia, e que foi usada por Kardec em quase todas as ocasiões em que falou no aspecto filosófico do Espiritismo.

Não obstante aparentemente simples, as questões do que é e para que serve a filosofia – no sentido acadêmico do termo – estão entre as que mais dificuldades e divergências causam entre os próprios filósofos profissionais. Esse mero fato, porém, já indica algo importante sobre a natureza da filosofia: o questionamento sistemático, incessante e profundo de tudo o que se afirma.

As origens da filosofia remontam à Grécia Antiga. Pela própria etimologia do termo, notamos que a filosofia era entendida como o amor do saber, ou a busca da verdade. Naquela época e, em certa medida, por muitos séculos da era cristã, a filosofia englobava todos os ramos do conhecimento puro (em contraste com as artes e ofícios, o conhecimento “aplicado”). Gradualmente, alguns desses ramos foram se tornando autônomos, como a matemática, a astronomia, a história, a biologia, a física. Mais ou menos a partir do século XVII, alguns deles começam a ser agrupados sob outra denominação: a de ciência.

Hoje em dia costuma-se considerar pertencentes ao tronco principal da filosofia as disciplinas da estética, lógica, ética, epistemologia e metafísica. De forma muito simplificada, pode-se dizer que a estética examina abstratamente a beleza e a feiúra; a lógica investiga o encadeamento formal das proposições; a ética estuda questões relativas ao bem e ao mal, aos direitos e deveres; a epistemologia ocupa-se do conhecimento, suas origens, fundamentos e limites, enquanto que a metafísica procura especular sobre a natureza última das coisas. Fora esses ramos fundamentais, há ainda diversos outros que resultam de suas interconexões e especializações, como a teologia, a filosofia política, a filosofia da linguagem, a filosofia da ciência.

Uma das principais correntes filosóficas contemporâneas propõe que a filosofia não deve ser entendida como a formulação ou defesa de teses ou conjuntos de teses sobre o que quer que seja, mas simplesmente como o desenvolvimento de métodos de análise crítica e sistemática, a serem aplicados especialmente ao chamado conhecimento científico. Nessa perspectiva, o filósofo seria alguém que tenta explicitar os conceitos, os pressupostos, a estrutura lógica e as implicações das teorias científicas, políticas, religiosas, etc. Semelhante atitude crítica – que não se confunde com uma crítica leviana, estouvada ou interesseira – seria a essência da filosofia, o elemento comum que permearia a grande variedade de linhas filosóficas existentes.

Embora quando se olhe para as abstrações e sutilezas tipicamente discutidas pelos filósofos se possa concluir que a filosofia para nada serve, a referida proposta talvez permita encontrar, num plano afastado do das necessidades materiais cotidianas, uma finalidade útil para a filosofia: a elucidação das bases, métodos e implicações das ciências e de outras disciplinas intelectuais, contribuindo assim para a identificação de fundamentos falsos ou inseguros, de falácias argumentativas, de dogmas encobertos.

Ensinando, ou pelo menos convidando, o homem a refletir criticamente sobre tudo o que se afirma ou faz em todos os setores, a filosofia de alguma forma auxilia o aprimoramento de seu intelecto e, talvez, de seus sentimentos, que o diferenciam de um mero ser que come, bebe, dorme e se reproduz.

3. A filosofia espírita
Passando agora à noção de filosofia espírita, uma observação preliminar importante é que no tempo de Kardec o sentido original, amplo, da palavra ‘filosofia’ ainda prevalecia, em boa medida. Assim, ao dizer que o Espiritismo era uma filosofia, Kardec não estava excluindo seu caráter científico, muito pelo contrário. Além disso, como a ética ou moral é uma das áreas da filosofia – e isso até hoje –, aquela designação também não excluía o aspecto moral do Espiritismo, que é a essência da chamada religião espírita. Detalharemos esses pontos nas seções seguintes deste trabalho.

Há referências à filosofia, ou à filosofia espírita, em todas as obras de Kardec. O significado preciso das expressões varia, é claro, segundo o contexto. De um modo geral, podemos identificar duas acepções principais da expressão, uma ampla e outra restrita.

Na acepção ampla, Kardec entende pela expressão alguma teoria, conjunto de teses, ou atividade intelectual que se caracterizam pela racionalidade, e se inserem portanto na tradição da filosofia acadêmica de cultivo do saber pelo saber. Nesse sentido a filosofia engloba a própria ciência e a moral, como já apontamos. Há dezenas de passagens nas obras de Kardec em que a expressão é usada nessa acepção. A primeira é, naturalmente, a já mencionada frase da folha de rosto.Vejamos algumas outras, restringindo-nos, por falta de espaço, ao Livro dos Espíritos (os itálicos do termo ‘filosofia’ são nossos).[1]

LE, Prolegômenos: “Este livro é o repositório de seus ensinos. Foi escrito por ordem e mediante ditado de Espíritos superiores, para estabelecer os fundamentos de uma filosofia racional, isenta dos preconceitos do espírito de sistema.”

LE, Prefácio da 2a edição (que não é mais reproduzido nas edições atuais): “O ensino relativo às manifestações dos Espíritos, propriamente ditas, bem como aos médiuns, forma uma parte distinta da filosofia espírita, podendo constituir objeto de um estudo especial” [a ser desenvolvido no Livro dos Médiuns].

LE, Conclusão, item V: “Três períodos distintos apresenta o desenvolvimento dessas idéias: primeiro, o da curiosidade, que a singularidade dos fenômenos produzidos desperta; segundo, o do raciocínio e da filosofia; terceiro, o da aplicação e das conseqüências. O período da curiosidade passou; a curiosidade dura pouco. Uma vez satisfeita, muda de objeto. O mesmo não acontece com aquilo que se dirige à razão e evoca reflexões sérias. Começou o segundo período, o terceiro virá inevitavelmente.”

LE, Conclusão, item VII: “O Espiritismo se apresenta sob três aspectos diferentes: o fato das manifestações, os princípios de filosofia e de moral que delas decorrem e a aplicação desses princípios. Daí, três classes, ou, antes, três graus de adeptos: [...]” [2]

Na acepção restrita da expressão ‘filosofia espírita’, Kardec refere-se a tópicos clássicos tratados pelos filósofos, como a existência e atributos de Deus, a distinção alma-corpo, as idéias inatas, o livre-arbítrio, a objetividade dos critérios morais, etc. Na maior parte das vezes em que ele usa o termo ‘filosofia’ nesse sentido mais específico, quer ressaltar um ponto de central importância: a capacidade que o Espiritismo tem de tratar com segurança, clareza e plausibilidade alguns dos mais espinhosos e desafiadores problemas filosóficos. Em alguns casos o ponto é mencionado genericamente; em outros ele considera explicitamente esses problemas. Vejamos alguns exemplos, começando com alguns trechos do primeiro tipo (destacamos o termo ‘filosofia’).

LE, Conclusão, item 1: “Pois bem! Sabei, vós que não credes senão no que pertence ao mundo material, que dessa mesa, que gira e vos faz sorrir desdenhosamente, saiu toda uma ciência, assim como a solução dos problemas que nenhuma filosofia pudera ainda resolver.”

LE, Conclusão, item 6: “Mesmo quem não testemunhou nenhum fenômeno material relativo às manifestações dos Espíritos diz para si próprio: à parte esses fenômenos, há a filosofia, que me explica o que nenhuma outra havia explicado. Nela encontro, por meio unicamente do raciocínio, uma solução racional para os problemas que no mais alto grau interessam ao meu futuro. Ela me dá calma, segurança, confiança; livra-me do tormento da incerteza.”

QE, Preâmbulo: No terceiro capítulo, publicamos um resumo de O Livro dos Espíritos, com a solução, pela doutrina espírita, de certo número de problemas do mais alto interesse, de ordem psicológica, moral e filosófica, que diariamente são propostos, e aos quais nenhuma filosofia deu ainda resposta satisfatória. [...] Procurem resolvê-los por qualquer outra teoria, sem a chave que nos fornece o Espiritismo; comparem suas respostas com as dadas por este, e digam quais são as mais lógicas, quais as que melhor satisfazem à razão.”

Vejamos agora algumas passagens com referências a problemas filosóficos tradicionais, que têm solução adequada pelo Espiritismo. Indicamos sumariamente entre colchetes o problema em questão.

LE, Introdução, item 17 [a continuidade evolutiva na criação]: “A razão nos diz que entre o homem e Deus outros elos necessariamente haverá, como disse aos astrônomos que, entre os mundos conhecidos, outros haveria, desconhecidos. Que filosofia já preencheu esta lacuna? O Espiritismo no-la mostra preenchida pelos seres de todas as ordens do mundo invisível e estes seres não são mais do que os Espíritos dos homens, nos diferentes graus que levam à perfeição. Tudo então se liga, tudo se encadeia, desde o alfa até o ômega.”

LE, item 222 [a desigualdade das aptidões face à justiça divina]: “Qual a filosofia ou a teosofia capaz de resolver estes problemas? É fora de dúvida que, ou as almas são iguais ao nascerem, ou são desiguais. Se são iguais, por que, entre elas, tão grande diversidade de aptidões?”

LM, par. 35, n. 2 [o futuro do homem]: “O Livro dos Espíritos. Contém a doutrina completa, como a ditaram os próprios Espíritos, com toda a sua filosofia e todas as suas conseqüências morais. É a revelação do destino do homem, a iniciação no conhecimento da natureza dos Espíritos e nos mistérios da vida de além-túmulo.”

ESE, cap. 5, item 6 [a dor face à justiça divina]: “Que dizer, enfim, dessas crianças que morrem em tenra idade e da vida só conheceram sofrimentos? Problemas são esses que ainda nenhuma filosofia pôde resolver, anomalias que nenhuma religião pôde justificar e que seriam a negação da bondade, da justiça e da providência de Deus, se se verificasse a hipótese de ser criada a alma ao mesmo tempo que o corpo e de estar a sua sorte irrevogavelmente determinada após a permanência de alguns instantes na Terra.”

CI, parte 1, cap. 1, item 13 [a questão do materialismo e do panteísmo]: Apresente-se-lhe, porém, um futuro condicionalmente lógico, digno em tudo da grandeza, da justiça e da infinita bondade de Deus, e ele repudiará o materialismo e o panteísmo, cujo vácuo sente em seu foro intimo, e que aceitará à falta de melhor crença. O Espiritismo dá coisa melhor; eis por que é acolhido pressurosamente por todos os atormentados da dúvida, os que não encontram nem nas crenças nem nas filosofias vulgares o que procuram. O Espiritismo tem por si a lógica do raciocínio e a sanção dos fatos, e é por isso que inutilmente o têm combatido.”

G, cap. 4, item 11 [a origem das faculdades espirituais do homem]: “Mas a história do homem, considerado como ser espiritual, se prende a uma ordem especial de idéias, que não são do domínio da Ciência propriamente dita e das quais, por este motivo, não tem ela feito objeto de suas investigações. A Filosofia, a cujas atribuições pertence, de modo mais particular, esse gênero de estudos, apenas há formulado, sobre o ponto em questão, sistemas contraditórios, que vão desde a mais pura espiritualidade, até a negação do principio espiritual e mesmo de Deus, sem outras bases, afora as idéias pessoais de seus autores. Tem, pois, deixado sem decisão o assunto, por falta de verificação suficiente.”

G, cap. 4, item 12 [origem e destino do homem]: “Esta questão, no entanto, é a mais importante para o homem, por isso que envolve o problema do seu passado e do seu futuro. A do mundo material apenas indiretamente o afeta. O que lhe importa saber, antes de tudo, é donde ele veio e para onde vai, se já viveu e se ainda viverá, qual a sorte que lhe está reservada. Sobre todos esses pontos, a Ciência se conserva muda. A Filosofiaapenas emite opiniões que concluem em sentido diametralmente oposto, mas que, pelo menos, permitem se discuta, o que faz com que muitas pessoas se lhe coloquem do lado, de preferência a seguirem a religião, que não discute.

OP, pp. 86-7 [o problema mente-corpo]: Onde acaba o poder da alma sobre os corpos? Qual a parte dessa força inteligente nos fenômenos do Magnetismo? Qual a do organismo? Aí estão questões de muito interesse, questões graves para a Filosofia, como para a Medicina. [...] Tínhamos, como se vê, grandes motivos para avançar que o estudo dos fenômenos magnéticos guarda fortes relações com a filosofia e a psicologia.

QE, pp. 169-70, 189 [a imortalidade da alma] As manifestações não são, pois, destinadas a servir aos interesses materiais; sua utilidade está nas conseqüências morais que delas dimanam; não tivessem, elas, porém, como resultado senão fazer conhecer uma nova lei da Natureza, demonstrar materialmente a existência da alma e sua imortalidade, e já isso seria muito, porque era largo caminho novo aberto à Filosofia. [...] Nas lições de filosofia clássica, os professores ensinam a existência da alma e seus atributos, segundo as diversas escolas, mas sem apresentar provas materiais. [...] Quando um cientista emite uma hipótese, sobre um ponto de ciência, procura com empenho e colhe com alegria tudo o que possa demonstrar a veracidade dessa hipótese; como, pois, um professor de filosofia, cujo dever é provar a seus discípulos que eles têm uma alma, despreza os meios de lhes fornecer uma patente demonstração?

Esses trechos ilustram bem a afirmação de Kardec em O que é o Espiritismo (diálogo com o cético, p. 65) de que “O Espiritismo prende-se a todos os ramos da Filosofia [...]”. E note-se que tal afirmação é confirmada não só por passagens como as citadas, em que o termo ‘filosofia’ aparece explicitamente (e há ainda muitas outras em que isso ocorre), mas também pelos estudos efetivamente desenvolvidos por Kardec acerca de numerosos outros tópicos filosóficos.

4. O que é ciência? [3]
Como já ressaltamos, aquilo que hoje chamamos ciência derivou da filosofia, tal qual entendida nos primeiros tempos de nossa cultura ocidental. É importante, pois, identificar os traços que servem para distinguir o conhecimento científico de outros tipos de conhecimento. Essa é uma das questões de que se ocupa um dos ramos especiais da filosofia mencionados anteriormente, a filosofia da ciência.

Notadamente na segunda metade do século XX, progressos significativos foram realizados nessa área. Reconhece-se hoje entre os especialistas que uma certa concepção de ciência cujas origens remontam à época do nascimento da ciência moderna, no século XVII, e que é comum até hoje entre o público leigo, padece de sérias inadequações. Ela não resiste nem a variados argumentos filosóficos levantados mais recentemente, nem ao confronto com a descrição da gênese, evolução e estrutura das disciplinas científicas maduras, ou seja, da física, da química e da biologia. A versão mais bem articulada dessa concepção é a doutrina filosófica conhecida como positivismo lógico, que teve seu apogeu nas décadas de 1920 e 1930.

Grosso modo, essa visão comum de ciência pressupõe que uma ciência inicia seu desenvolvimento com um período longo de coleta de dados experimentais (dados empíricos, na linguagem filosófica); nessa etapa não compareceriam hipóteses teóricas de nenhuma espécie. Uma vez de posse de um conjunto suficientemente grande e variado de dados, os cientistas aplicariam então certos métodos supostamente seguros e neutros para obter as teorias científicas, que seriam descrições objetivas da realidade investigada.

O exame cuidadoso da história da ciência e os argumentos filosóficos desenvolvidos pelos filósofos da ciência contemporâneos mostraram que essa caracterização da ciência não somente não corresponde ao que de fato ocorreu e continua ocorrendo com as ciências bem estabelecidas, como também pressupõe procedimentos impossíveis de serem levados a cabo. Observação e teoria, experimento e hipótese nascem e se desenvolvem juntos, num complexo processo simbiótico de suporte recíproco. A acumulação prévia de dados neutros, ainda que fosse possível, seria inútil. Nenhum conjunto de dados leva de modo lógico a leis científicas; a imaginação criadora do homem desempenha papel essencial na gênese das teorias científicas.

A imagem de ciência a que os filósofos da ciência chegaram a partir das pesquisas recentes indica que uma ciência autêntica consiste, de modo simplificado, de um núcleo teórico principal, formado por leis fundamentais, introduzidas a título de hipóteses. Esse núcleo é circundado por hipóteses auxiliares, que o complementam e efetuam sua conexão com os dados empíricos. Essa estrutura teórica mais ou menos hierarquizada faz-se acompanhar de determinadas regras, nem sempre explícitas, que norteiam o seu desenvolvimento. De um lado, há a regra “negativa”, que estipula que nesse desenvolvimento os princípios do núcleo teórico devem, o quanto possível, ser mantidos inalterados. Eventuais discrepâncias entre as previsões da teoria e as observações experimentais devem ser resolvidas por ajustes nas partes menos centrais da malha teórica, constituídas pelas hipóteses auxiliares. Regras “positivas” sugerem ao cientista como, quando e onde essas correções e complementações devem ser efetuadas. Essa é uma descrição sucinta e simplificada daquilo que o filósofo da ciência contemporâneo Imre Lakatos chamou de programa científico de pesquisa. [4]

A exigência fundamental de um programa científico de pesquisa é que a estrutura teórica como um todo forneça previsões empíricas corretas, ou seja dê conta dos fatos. Outras características importantes de qualquer boa teoria científica são: a consistência: a teoria não pode envolver contradições; a coerência: os princípios da teoria devem apoiar-se mutuamente; a abrangência: a teoria deve explicar, ao menos em linhas gerais, todos os principais fenômenos de seu domínio; deve ainda exibir unidade e simplicidade, ou seja, a explicação que fornecem dos diversos fenômenos deve decorrer de maneira natural e simples de um corpo de leis teóricas integrado e tão reduzido quanto possível. Há, por fim, o vínculo externo de não conflitar com as demais teorias científicas bem confirmadas que tratem de domínios de fenômenos complementares.

Tendo fornecido essa noção geral, bastante simplificada e incompleta, da concepção contemporânea de ciência, passemos à questão da ciência espírita.

5. A ciência espírita
A inspeção meticulosa e isenta das origens, estrutura e desenvolvimento do Espiritismo revela que ele possui todos requisitos de uma ciência genuína, segundo as caracterizações da filosofia da ciência contemporânea, como a esboçada na seção precedente. Em artigo anterior, “A excelência metodológica do Espiritismo”, procuramos mostrar, além disso, que Allan Kardec antecipou-se às conquistas recentes da filosofia da ciência, e compreendeu muito bem a questão. Sua visão de ciência, exposta explícita e implicitamente em seus escritos, corresponde efetivamente à visão que os filósofos da ciência têm hoje. Isso teve a conseqüência feliz de que, ao travar contato com uma nova ordem de fenômenos, Kardec empregou em sua investigação métodos e critérios corretos, o que lhe possibilitou a implantação de uma verdadeira ciência do espírito.

O corpo teórico fundamental do Espiritismo encontra-se delineado em O Livro dos Espíritos. O exame dessa obra revela a adequação da teoria com os fatos, sua consistência e seu alto grau de coesão e simplicidade, bem como a amplitude de seu escopo. Ademais, ali estão implicitamente presentes as diretrizes que nortearam os desenvolvimentos ulteriores das investigações espíritas. Muitos desses desenvolvimentos foram, como se sabe, implementados pelo próprio Kardec, e se acham expostos nas demais obras que escreveu. Consoante com a natureza de uma verdadeira ciência, o progresso experimental e teórico do Espiritismo prossegue até hoje, pelos esforços de pesquisadores encarnados e desencarnados.

Em contraste com os fundamentos científicos sólidos lançados por Kardec no estudo do elemento espiritual do homem, as linhas de pesquisa que surgiram mais tarde, com a pretensão competir com o Espiritismo nessa área, não alcançaram o mesmo sucesso. Deve-se notar, a tal respeito, que elas tiveram início justamente na época em que o positivismo lógico fornecia os parâmetros segundo os quais uma atividade genuinamente científica se desenvolveria. Ora, tais parâmetros sendo equivocados, como os filósofos perceberam depois, as linhas de pesquisa nascentes, que alimentavam a pretensão à cientificidade, acabaram por assimilar uma visão de ciência irreal. Isso levou a que adotassem métodos inadequados aos fins a que se propuseram, bloqueando-lhes as possibilidades de contribuir significativamente para o avanço de nosso conhecimento no domínio do espírito.

Lamentavelmente, a adoção de uma concepção falha de ciência levou os pesquisadores dessas linhas de investigação a não somente empenharem de modo infrutífero os seus esforços, como também a desprezarem, ou mesmo repelirem, as conquistas e métodos de uma legítima ciência do espírito, o Espiritismo. Uma análise mais detalhada desse ponto pode ser encontrada na seção 4 de “A excelência metodológica do Espiritismo”, e não será reproduzida aqui.

6. A ciência espírita e as ciências acadêmicas
Contrariamente ao que alguns críticos mal informados acerca do Espiritismo e das teorias científicas contemporâneas alegam, o Espiritismo não conflita com qualquer uma das teorias científicas maduras, quer da física, quer da química ou da biologia. É de crucial importância notar que embora o Espiritismo seja uma ciência, ele não se confunde com tais ciências, do mesmo modo como elas não se confundem entre si. Os domínios de fenômenos por elas tratados não coincidem, sendo antes complementares.

Kardec compreendeu perfeitamente bem essa distinção, e chamou a atenção para ela em diversos de seus textos, como por exemplo no item VII da Introdução do Livro dos Espíritos. Ali argumentou com segurança que “o Espiritismo não é da alçada da ciência”, ou seja, das ciências acadêmicas. Por outro lado, no parágrafo 16 do primeiro capítulo de A Gênese, enfatizou a referida complementaridade do Espiritismo e dessas ciências, afirmando que “o Espiritismo e a ciência completam-se reciprocamente”.[5]

A percepção desses pontos evita uma série de julgamentos e posturas equivocados, que têm ameaçado o movimento espírita atual. Vêem-se, com efeito, pessoas que imaginam que a ciência espírita consiste justamente naquelas linhas de investigação iniciadas depois de Kardec, e cuja fragilidade científica é evidente, à luz de uma análise filosófica cuidadosa. Outros pensam que a ciência espírita consiste de investigações do âmbito das ciências acadêmicas, especialmente as que envolvam experimentos conduzidos com o auxílio de aparelhagens complexas, de uso nos laboratórios de física, e dentro de referenciais teórico-conceituais emprestados dessa ciência. Assume-se que é o uso desses aparelhos e o emprego de terminologia técnica (aliás quase sempre não compreendida por quem a usa dentro de tais contextos) que confere cientificidade às investigações.

Dada a gravidade dos enganos envolvidos em semelhantes posições, vale a pena nos determos um pouco mais sobre elas. Deve-se, além dos esclarecimentos gerais já indicados, notar que o estabelecimento dos princípios básicos do Espiritismo prescinde completamente do uso de qualquer aparelho e do recurso a qualquer teoria física. O mais fundamental de tais princípios é o da existência do espírito, ou seja, da existência de algo no homem que é a sede do pensamento e dos sentimentos e sobrevive à morte corporal. Como enfatizou Kardec, a comprovação cabal desse princípio se dá mediante os fenômenos a que denominou “de efeitos intelectuais”, quais sejam a tiptologia, a psicofonia e a psicografia. Quem quer que reflita com isenção sobre fenômenos dessa ordem não terá dificuldade em reconhecer que atestam a existência do espírito de modo inequívoco.

Nessa avaliação, é importante notar a diferença que existe entre esse princípio básico do Espiritismo e alguns dos princípios das teorias físicas e químicas contemporâneas, por exemplo. Nestes últimos casos, o “grau teórico” (se assim nos podemos exprimir) é muito maior, ou, em outros termos, os princípios estão muito mais distantes do nível fenomenológico, ou seja, da observação empírica direta. O caminho que vai da observação até o princípio teórico é bastante indireto, passando por uma série de teorias auxiliares, necessárias, por exemplo, para tratar do funcionamento e interpretação dos dados dos aparelhos envolvidos. Nessas circunstâncias, a segurança com que os princípios podem ser afirmados fica evidentemente limitada; há em geral possibilidades plausíveis de explicações dos mesmo fenômenos através de princípios teóricos diferentes. E, de fato, a história da física e da química tem ilustrado a instabilidade de suas teorias que avançam além do nível da percepção direta.

No caso do referido princípio espírita, bem como de vários outros dos princípios básicos do Espiritismo, a situação é bastante diversa. Trata-se de princípios pertencentes à classe de princípios a que os filósofos denominam “fenomenológicos”, que estão na base do edifício do conhecimento, dado o seu alto grau de certeza. Proposições dessa classe são, por exemplo, as de que o fogo queima e a cicuta envenena.

Notemos que a inferência espírita diante de um fenômeno de efeitos intelectuais – a saber, que são causados por uma inteligência humana desencarnada – não difere em nada das inferências que fazemos a partir dos fenômenos ordinários. Quando, por exemplo, o carteiro traz à nossa casa um papel no qual lemos certas frases, não nos acudirá à cabeça a idéia de que elas não foram escritas por um determinado amigo, por exemplo, quando relatam fatos, contêm expressões e expressam pensamentos peculiares e íntimos, característicos daquele amigo. Exatamente o mesmo se dá com numerosos e variados casos de psicografia ou outras manifestações inteligentes. Não constitui exagero, pois, afirmar-se que a constatação cuidadosa de uns poucos casos dessa espécie é suficiente para eliminar qualquer dúvida acerca da sobrevivência do ser.

É importante observar, por fim, que além dos fenômenos especiais que formam a classe dos fenômenos espíritas, o Espiritismo apóia-se também em uma multidão de fenômenos ordinários, em virtude de oferecer uma base sólida para sua compreensão. Referimo-nos, por exemplo, às nossas inclinações e sentimentos, às peculiaridades de nosso relacionamento com as pessoas que nos cercam, aos acontecimentos marcantes de nossas vidas, aos distúrbios da personalidade, aos efeitos psicossomáticos, aos sonhos, à evolução das espécies e das civilizações, etc.

Entendemos que a desconsideração desse vasto corpo de evidências indiretas a favor do Espiritismo constitui omissão séria da parte de seus críticos. Com seu agudo senso científico, Kardec percebeu desde o início que o alcance do Espiritismo transcendia de muito os fenômenos mediúnicos e anímicos específicos que motivaram o seu surgimento. “O estudo do Espiritismo é imenso”, disse Kardec em outra passagem; “interessa a todas as questões da metafísica e da ordem social; é todo um mundo que se abre diante de nós” (O Livro dos Espíritos, Introdução, item XIII).

7. O aspecto religioso do Espiritismo [6]
Do mesmo modo como tem havido falta de compreensão acerca do caráter científico do Espiritismo e de suas relações com as ciências, seu caráter religioso e suas relações com as religiões também têm constituído ponto de freqüentes confusões. Assim como se pode mostrar ser o Espiritismo científico, embora não se inclua entre as ciências ordinárias, por estudar um domínio diverso de fenômenos, pode-se, conforme o fez o próprio Kardec, mostrar que o Espiritismo é religioso, embora não se confunda com as religiões ordinárias. Se no estabelecimento da primeira dessas teses é necessário identificar corretamente que características de uma teoria a tornam científica, temos, para justificar a segunda, que estabelecer critérios adequados para a classificação de uma doutrina no âmbito religioso.

A palavra religião evoca, por sua origem, à idéia da “re-ligação” do homem ao Criador. Como se sabe, ao longo da história inúmeras propostas se apresentaram de como essa “re-ligação” deve ser entendida e efetuada, resultando daí as diversas “religiões”.

Afora divergências sobre a própria noção de Deus e da natureza do ser humano, as religiões se diferenciam quanto aos requisitos propostos para que a criatura se religue a Deus. Quase sempre, eles incluem a adequação da conduta a certas regras morais. Tipicamente, também incluem a satisfação de providências formais e externas de vária ordem: participação em cultos, rituais, cerimônias; realização de determinados gestos; recitação de fórmulas e rezas; adoração de imagens e objetos diversos; promessas, penitências, jejuns, etc.

Ora, já se pode perceber aqui algumas distinções fundamentais entre o Espiritismo e as religiões ordinárias. Como elas, o Espiritismo também se preocupa com o destino do homem, na Terra e no além-túmulo, procurando instruí-lo quanto ao que deve fazer para que alcance estados de felicidade cada vez maior. No entanto, o Espiritismo propõe que esse objetivo pode ser alcançado exclusivamente pela adaptação da conduta a determinados preceitos morais. Qualquer medida de ordem exterior é mostrada ser não somente ineficaz, mas também, em muitos casos, nociva, por desviar a atenção do ponto principal e induzir ao sectarismo.

Depois, uma diferença crucial surge no modo pelo qual as regras éticas são justificadas. As religiões ordinárias procuram justificar as normas morais que propõem recorrendo à autoridade desse ou daquele indivíduo ou instituição. Já o Espiritismo fundamenta o corpo de seus princípios éticos – sintetizados no preceito cristão do amor ao próximo – no conhecimento que cientificamente alcança das conseqüências das ações humanas ao longo da existência ilimitada dos seres, conjugado à cláusula teleológica de que todos almejam a felicidade. Não há aqui lugar para dogmas e imposições, mas exclusivamente investigação livre e racional dos fatos. Aliás esse já era o modo pelo qual o Apóstolo Paulo entendia a moral, pois em sua primeira carta aos Coríntios (10:23) asseverou: “Todas as coisas são lícitas, mas nem todas convêm; todas são lícitas, porém nem todas edificam.”

Em diversas de suas obras, Kardec deu grande importância ao estabelecimento da moral espírita, abordando o assunto em profundidade. Mostrou que, com o conhecimento científico espírita, a moral deixa de ser uma questão de especulações abstratas ou de opiniões, estando indissociavelmente ligada ao estudo dos efeitos naturais das ações humanas, em conexão com a busca da felicidade, objetivo comum de todos os seres humanos. Ressaltou ainda que o corpo de princípios morais obtidos por essa via da razão e da experiência coincide com aquele proposto por Jesus. Conforme registrou no parágrafo 56 do primeiro capítulo de A Gênese, o Espiritismo “[dá] por sanção à doutrina cristã as próprias leis da Natureza”.

Ora, na medida em que fornece ao homem conhecimento seguro das regras de conduta capazes de harmonizá-lo consigo mesmo e com os demais seres – e portanto, efetivamente, com o plano divino –, o Espiritismo torna-se “o mais potente auxiliar da religião”, conforme nota Kardec nos lúcidos comentários adidos às questões 147 e 148 de O Livro dos Espíritos. A religião aqui aludida não se confunde, evidentemente, com as doutrinas religiosas tradicionais, com suas hierarquias, dogmas inquestionáveis e práticas exteriores, sendo antes uma religião no sentido próprio do termo, explicado acima.

A velha questão de se o Espiritismo é ou não uma religião não admite, pois, resposta unívoca, dada a duplicidade semântica do termo ‘religião’. Esse ponto foi estudado em profundidade no artigo de Kardec intitulado justamente “Le Spiritisme est-il une religion?”, que apareceu na Revue Spirite de 1868.[7] Para encerrar, vejamos estes parágrafos do famoso texto:

[...] o Espiritismo é, assim, uma religião? Sim, sem dúvida, senhores: No sentido filosófico o Espiritismo é uma religião, e disso nos honramos, pois que é a doutrina que funda os laços da fraternidade e da comunhão de pensamentos não em uma simples convenção, mas sobre a mais sólida das bases: as próprias leis da Natureza.

Por que então declaramos que o Espiritismo não era uma religião? Pela razão de que há apenas uma palavra para exprimir duas idéias diferentes, e que, segundo a opinião geral, o termo religião é inseparável da noção de culto, evocando unicamente uma idéia de forma, com o que o Espiritismo não guarda qualquer relação. Se se tivesse proclamado uma religião, o público nele não veria senão uma nova edição, ou uma variante, se quisermos, dos princípios absolutos em matéria de fé, uma casta sacerdotal com seu cortejo de hierarquias, cerimônias e privilégios; não o distinguiria das idéias de misticismo e dos enganos contra os quais se está freqüentemente bem instruído.

Não apresentando nenhuma das características de uma religião, na acepção usual da palavra, o Espiritismo não poderia nem deveria ornar-se de um título sobre cujo significado inevitavelmente haveria mal-entendidos. Eis porque ele se diz simplesmente uma doutrina filosófica e moral.

8. Conclusões
Inegavelmente, o Espiritismo é um empreendimento intelectual de ampla envergadura. Em diversas ocasiões Allan Kardec ressaltou o seu caráter abrangente, bem como a importância de considerá-lo em seu conjunto, quando se trata de avaliá-lo e de investigar suas implicações.

Como vimos, na primeira linha da segunda edição do Livro dos Espíritos Kardec caracterizou-o sucintamente como “filosofia espiritualista”. Espiritualista, porque estando centrado na constatação de que o homem é essencialmente, enquanto ser pensante, espírito, insere-se no âmbito das doutrinas que se contrapõem ao materialismo. Filosofia, porque investiga esse ser espiritual segundo uma abordagem racional, sistemática e abrangente, típica da tradição de pesquisa inaugurada pelos filósofos gregos, e que permeia toda a cultura ocidental até hoje. Nesse sentido original, a filosofia abarcava todos os ramos do saber puro. Mesmo aquilo que, a partir de uma certa época da história do pensamento, passou a ser chamado de ciência caía sob o escopo da filosofia.

Assim, a caracterização kardequiana em análise não deve ser tomada como excluindo a dimensão científica do Espiritismo, muito pelo contrário. Conforme deixou claro no desdobramento de suas pesquisas, Kardec compreendeu que tal dimensão não somente existia, mas que constituía mesmo a base sobre a qual a filosofia espírita repousa. Note-se, por exemplo, que no preâmbulo de O que é o Espiritismo Kardec o define como “uma ciência que trata da natureza, origem e destino dos Espíritos, bem como de suas relações com o mundo corporal”. Quando bem compreendida, essa definição não conflita com a que está na página de rosto do Livro dos Espíritos. Apenas salienta que os fundamentos da filosofia espírita são científicos, e não puramente especulativos, ou derivados de alguma tradição mística, religiosa, ou qualquer outra. Foi a análise científica de certos fenômenos que deu origem ao Espiritismo, e estabeleceu desde então o núcleo teórico sobre o seu objeto de estudo, ou seja, o espírito.

No entanto, como essa análise conduz, por sua própria natureza, a tópicos extremamente abrangentes e fundamentais, no que diz respeito ao conhecimento do espírito, ela avança por domínios tipicamente considerados filosóficos, mesmo segundo a concepção contemporânea, mais restrita, de filosofia. O caso quiçá mais importante dessa extensão é o da moral (ou ética). Kardec explorou com grande lucidez as implicações do conhecimento científico espírita para as questões-chave da moral, dentre as quais a da fundamentação das regras morais. Fez notar que o conhecimento científico acerca do homem propiciado pelo Espiritismo permite o estabelecimento de um corpo de princípios morais objetivos, e que ele coincide com aqueles propostos pelo Cristo. Salientou ainda que tais princípios sintetizam o que há de essencial na noção de religião. Nesse sentido, e apenas nele, o Espiritismo pode ser dito uma religião, adverte Kardec no famoso artigo da Revue Spirite.

Dessa forma, os chamados “três aspectos” (ou “partes”) do Espiritismo encontram-se inextricavelmente ligados. Talvez mesmo devêssemos evitar a utilização dessa expressão, porque pode induzir à idéia errônea de que se trata de três elementos separados ou separáveis, que agrupamos apenas por conveniência. É significativo, a esse respeito, que o próprio Kardec tenha evitado caracterizar o Espiritismo em tais termos. Quando tentou sintetizar a natureza do Espiritismo, recorreu ora à noção de filosofia, ora à de ciência, dependendo do contexto. Mas em ambos os casos indicou que não se tratava de uma delimitação muito estreita da noção.

Se pensarmos no Espiritismo em termos de filosofia, será uma filosofia apoiada em bases científicas, e que tem como um dos objetivos centrais o estudo das questões morais. Se pensarmos em termos de ciência, não será uma pesquisa seca, que simplesmente constate e sistematize fatos, mas de uma investigação de longo alcance sobre um objeto de fundamental importância, o elemento espiritual. Essa ciência complementa, pois, as ciências acadêmicas, cujo objeto de estudo é o elemento material. E, pela própria natureza de seu objeto de estudo, a ciência espírita necessariamente diz respeito a tópicos genuinamente filosóficos, dentre os quais ressalta, por sua importância prática, aqueles referentes à moral.

Referências
Chalmers, A. F. What is this Thing called Science? 2nd. ed., Buckingham, Open University Press, 1982.
Chibeni, S. S. “Os fundamentos da ética espírita”, Reformador, junho de 1985, pp. 166-9.
–––. “A excelência metodológica do Espiritismo”, Reformador, novembro de 1988, pp. 328-333, e dezembro de 1988, pp. 373-378.
–––. “Ciência espírita”, Revista Internacional de Espiritismo, março 1991, pp. 45-52.
–––. “O paradigma espírita”, Reformador, junho de 1994, pp. 176-80.
–––. “As acepções da palavra ‘Espiritismo’ e a preservação doutrinária”. Reformador, julho de 1999, pp. 212-214. (Questões sobre a natureza do Espiritismo – I.)
–––. “Revisão da terminologia espírita?”. Reformador, agosto de 1999, pp. 250-252. (Questões sobre a natureza do Espiritismo – II.)
–––. “A religião espírita”. Reformador, setembro de 1999, pp. 280-282. (Questões sobre a natureza do Espiritismo – III.)
–––. “A ‘ciência oficial’”. Reformador, outubro de 1999, pp. 312-313. (Questões sobre a natureza do Espiritismo – IV.)
–––. “As relações da ciência espírita com as ciências acadêmicas”. Reformador, novembro de 1999, pp. 344-346. (Questões sobre a natureza do Espiritismo – V.)
–––. “Algumas abordagens recentes dos fenômenos espíritas”. Reformador, dezembro de 1999, pp. 380-383. (Questões sobre a natureza do Espiritismo – VI.)
–––. “A pesquisa científica espírita” Reformador, janeiro de 2000, pp. 24-25. (Questões sobre a natureza do Espiritismo – VII.)
Kardec, A. Le Livre des Esprits. Reprodução fotomecânica da 1a ed. francesa. 1a ed, bilíngüe, trad. e ed. Canuto Abreu. São Paulo, Companhia Editora Ismael, 1957.
–––. Livre des Esprits. Reprodução fotomecânica da 2a ed. francesa, com adendos do Autor. 1a. ed., Rio, Federação Espírita Brasileira, 1998.
–––. O Livro dos Espíritos. Trad. de Guillon Ribeiro. 43a ed., Rio de Janeiro, Federação Espírita Brasileira, s.d.
–––. Revue Spirite. Coleção da Federação Espírita do Paraná.
–––. Qu'est-ce que le Spiritisme. Paris, Dervy-Livres, 1975.
–––. O que é o Espiritismo. (s. trad.) 25a ed., Rio de Janeiro, Federação Espírita Brasileira, s.d.
–––. Le Livre des Médiums. Paris, Dervy-Livres, 1972.
–––. O Livro dos Médiuns. Trad. Guillon Ribeiro, 59a ed., revista, Rio de Janeiro, Federação Espírita Brasileira, s.d.
–––. Voyage Spirite en 1862. Paris, Vermet, 1988.
–––. 2 L’Évangile selon le Spiritisme. (Reprodução fotográfica da 3a edição francesa.) 1a ed., Rio de Janeiro, Federação Espírita Brasileira, 1979.
–––. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. 113a ed., Rio, FEB.
–––. Le Ciel et l’Enfer.Farciennes, Editions de l’Union Spirite, 1951.
–––. O Céu e o Inferno. Trad. de Manuel Quintão. 28ª edição, Rio de Janeiro, Federação Espírita Brasileira, s.d.
–––. La Genèse, les Miracles et les Prédictions selon le Spiritisme. Paris, La Diffusion Scientifique, s.d.
–––. A Gênese, os Milagres e as Predições segundo o Espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro, 23a ed., Rio de Janeiro, Federação Espírita Brasileira, s. d.
–––. Oeuvres Posthumes. (Ed. André Dumas.) Paris, Dervy-Livres, 1978. Também na edição original de Leymarie, em texto eletrônico, Centre d'Études Spirites Léon Denis: http://perso.wanadoo.fr/charles.kempf/
–––. Obras Póstumas. Trad. Guillon Ribeiro, 18a ed., Rio de Janeiro, Federação Espírita Brasileira, s.d.
Lakatos, I. “Falsification and the methodology of scientific research programmes”. In: Lakatos I, e Musgrave, A. (eds.) Criticism and the Growth of Knowledge. Cambridge, Cambridge University Press, 1970. Pp. 91-195.

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[1] Neste trabalho usaremos as seguintes abreviações: LE - O Livro dos Espíritos; QE – O que é o Espiritismo; LM – O Livro dos Médiuns; ESE – O Evangelho Segundo o Espiritismo; CI – O Céu e o Inferno; G – A Gênese; OP – Obras Póstumas (as referências de páginas deste livro são feitas pela tradução da FEB); VE – Viagem Espírita em 1862 (páginas pela edição francesa corrente).
[2] Outros exemplos importantes do uso da expressão ‘filosofia espírita’ na acepção ampla estão em: LM, parágrafos 14 (n. 7) e 32, capítulo 31 (item 18); OP, pp. 221, 247 e 253; QE, Preâmbulo; VE, pp. 6, 8 e 20.
[3] Esta seção e a seguinte aproveitam partes de nossos artigos “Espiritismo e ciência” e “A excelência metodológica do Espiritismo”, que deverão ser consultados para um tratamento mais detalhado do assunto. Ver também os artigos sobre ciência espírita na série “Questões sobre a natureza do Espiritismo”. As referências são dadas no final deste trabalho.
[4] Ver Lakatos 1970. Para uma exposição acessível dessa e de outras abordagens da questão da natureza da ciência, consulte-se Chalmers 1982. Para uma análise da ciência espírita à luz de outra teoria filosófica contemporânea acerca da ciência, elaborada por Thomas Kuhn mais ou menos no mesmo período, ver nosso artigo “O paradigma espírita”.
[5] Note-se que nessas citações o termo ‘ciência’ é usado numa acepção mais restrita do que a anteriormente elucidada. Para um estudo mais completo da análise kardequiana das relações entre o Espiritismo e as ciência ordinárias, ver a seção 3 de “A excelência metodológica do Espiritismo” e as partes IV e V da série “Questões sobre a natureza do Espiritismo”.
[6] Esta seção aproveita idéias e trechos de nossos artigos “Os fundamentos da ética espírita”, “A excelência metodológica do Espiritismo”, seção 5, e “A religião espírita” (o terceiro artigo da série “Questões acerca da natureza do Espiritismo”), que deverão ser consultados para um maior desenvolvimento do assunto.
[7] Dezembro, pp. 353-62. Note-se que se trata de uma dos últimos números da Revue compostos por Kardec. O texto expressa, pois, o seu pensamento mais refletido sobre o assunto.