domingo, 7 de dezembro de 2008

RELACIONAMENTO HUMANO E TECNOLOGIA



Relacionamento humano e tecnologia



CONSTRUTORES DE PONTES

“Você sabe o que é um Pontífice? Certamente que sim. Pontífice é o sacerdote de maior hierarquia numa religião. Por exemplo: o Papa é um "pontífice". Contudo, queremos falar sobre o significado desta palavra na Antigüidade. Pontífice era um construtor de pontes.

Como você pode perceber, todos nós podemos ser pontífices, mesmo que não tenhamos a menor idéia de como se constrói uma ponte de madeira, de aço ou de concreto. Podemos construir pontes de relacionamento entre nós e outras pessoas Essa ponte deve partir do nosso coração para os corações das outras pessoas.

Construir pontes é construir relacionamentos, e para que esse relacionamento seja saudável e duradouro temos que respeitar as características da pessoa, ao mesmo tempo em que anulamos ou controlamos alguns dos nossos impulsos menos felizes.”

Amilcar Del Chiaro Filho



Os últimos duzentos anos modificaram profundamente a face do planeta. Nações antes poderosas mergulharam no esquecimento e novos poderes se estabeleceram com base na automação e na informatização. Avanços significativos que se por um lado trouxeram grandes benefícios materiais e possibilidades novas, por outro tornaram a vida sofisticada e no entanto, mais triste.

O texto que usamos como epígrafe nos sugere a construção de novas pontes de relacionamento, diante das transformações havidas e não totalmente assimiladas pelo grosso da população, o que tem gerado não apenas o distanciamento entre as gerações, como também o esfriamento nas relações humanas.

As relações sociais sofreram profundas mudanças, e no seu bojo a família tradicional perdeu seu lugar, bem como a sociedade, tal como a concebíamos, também se extinguiu no torvelinho das dores coletivas e das prementes necessidades de sobrevivência, que levam milhões de homens e mulheres de todas as idades a viver em busca do sustento diário sob condições adversas, sem muitos espaços ou momentos de convivência que alimentem o espírito cansado pelas lutas diárias.

A sociedade hoje, disse Umberto Eco, não é mais como uma praça onde as pessoas se encontravam para comerciar, para trocar idéias, relacionarem-se, informarem-se e compartilhar experiências. A sociedade hoje é como uma avenida, onde as pessoas passam umas pelas outras sem se verem ou se falarem, apenas observando as vitrines.

Nem mesmo Kubrick poderia imaginar que 2001 chegaria e passaria sem nenhuma odisséia no espaço. Pelo contrário, um episódio que mudaria os rumos da história aconteceu aqui mesmo em terra firme. Nem George Orwell, em seu “1984”, imaginou que o Grande Irmão se faria tão onipotente com olhos eletrônicos onipresentes e vozes monotônicas e repetitivas até a exaustão. Um admirável mundo novo não pensado por Huxley está aí, à nossa volta, onde cabe muito bem o Eu robô, de Isaac Asimov.

Em meio a todos esses prognósticos sombrios, uma humanidade cansada de guerras anseia por segurança e paz, diante do fim das energias utópicas e das ideologias. Restou um amplo espaço para todos os tipos de esoterismos e para seitas que buscam preencher os vazios existenciais e o desespero das multidões miseráveis com uma teologia que promete prosperidade infinita. Há uma busca generalizada por um propósito e um novo sentido para a existência.

A tecnologia da qual nos servimos quase que obrigatoriamente, paradoxalmente nos une, limita e separa. Na era da comunicação temos dificuldades para encontrar tempo para relacionamentos mais estáveis. “Não tenho tempo”. Essa é uma frase comum, e aqueles que as pronunciam em geral não estão mentindo. A mesma tecnologia que nos possibilita rápidos contatos nos impede o diálogo com calor humano. Essa é a mesma tecnologia que nos rouba o tempo para conviver e saborear a vida.

Alteridade é uma palavra que ainda soa estranha aos nossos ouvidos. Propõe uma nova ética de relacionamento e, portanto, um novo comportamento perante os que pensam ou são diferentes de nós. Não um relacionamento morno e amorfo, pasteurizado, onde não possa existir a divergência e as diferenças naturais de opinião, que são indicadores de saúde e vitalidade na comunidade humana. Somente a tirania e o despotismo podem estabelecer o silêncio absoluto e a paz de superfície. A alteridade é possível se houver a superação da robotização dos relacionamentos.

Apesar do quadro sombrio que se nos apresenta, é preciso convir que a humanidade tem sabido contornar situações-limite ao longo de sua história. Assírios e babilônios, caldeus e persas, egípcios, gregos e romanos, superaram as ausências dos pilares de sustentação de suas civilizações e aqui estamos, herdeiros do nosso passado, diante da necessidade de reinventar caminhos, desta vez mais amplos, por onde possam passar mais e mais pessoas.

Num mundo onde a violência predomina, o diálogo, a convivência respeitosa e a disposição de ouvir o outro e solucionar conflitos sem confrontos, torna-se questão de sobrevivência. Alguns mais pessimistas antecipam o cliocídio, o fim da história. Porém, a felicidade é possível, embora só possa ser conjugada no futuro, pois no presente apenas ansiamos por ela e a construímos aos poucos.

A convivência com base no diálogo também é possível, mas depende de determinação e de boa vontade, de disposição de espírito e abertura para um longo e talvez penoso exercício de tolerância baseada no respeito pelas razões alheias.



- Paulo R. Santos (MG)

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